sexta-feira, 7 de março de 2008

CORRIGINDO

Obviamente no título da mensagem anterior a referência é à ausência de interesse proceSSual e não proceSual. Desulpem pelo erro de digitação.

PROCURAÇÃO EM CAUSA PRÓPRIA - DECLARATÓRIA - FALTA DE INTERESSE PROCESUAL - INDEFERIMENTO DA INICIAL

Autos nº : 0707 07 142.........

Classe : Declaratória

Requerentes : ............... e .....................

Requerido : O Juízo

Decisão

............ e .........., ajuizaram a presente ação por eles denominada de “DECLARATÓRIA DE PROPRIEDADE DE IMÓVEL”, alegando, em síntese, que seus genitores adquiriram de .................. e sua mulher a casa residencial e seu respectivo terreno, situados nesta cidade, na Alameda ............., nº ........., no bairro ........., mediante escritura pública de procuração em causa própria, não levada a registro imobiliário e posteriormente retificada por outra escritura pública; com o falecimento dos genitores procederam os requerentes aos respectivos inventário, declarando erroneamente encontrar-se o imóvel inscrito no registro imobiliário em nome dos Inventariados, seus falecidos genitores, obtendo o formal de partilha que não pode ser registrado, em virtude de ainda encontrar-se o imóvel registrado em nome de ...................

Em razão disso postulam deste juízo a declaração de serem “possuidores a justo título, do bem inventariado e descrito no articulado 1 (fl. ....., dos autos de inventário/arrolamento nº 0707......... e fl..... dos autos de inventário/ arrolamento nº 0707........), em virtude de sua aquisição pelos meios da lei civil e, via de conseqüência, seja expedido Alvará endereçado ao Cartório de Registro de Imóveis desta Comarca, para proceder o registro do Formal de Partilha, em nome dos herdeiros requerentes”.

Relatados no essencial, DECIDO.

De início é de se rejeitar a pretensão dos requerentes de se expedir alvará para obrigar o Cartório de Registro de Imóveis a registrar o formal de partilha expedido, porquanto tal ocorrendo, quando ainda registrado o imóvel em nome de terceiros e não das pessoas inventariadas, estaria se violando a lei, por afronta ao princípio da continuidade.

Nesse sentido:

REGISTRO PÚBLICO - DÚVIDA - TÍTULOS ANTECEDENTES - EXIGÊNCIAS PENDENTES - TÍTULO POSTERIOR - REGISTRO - IMPOSSIBILIDADE. Adjudicação de imóveis em hasta pública não é forma originária de aquisição de propriedade. Remanescendo pendentes exigências acerca de títulos levados a registro em antecedência à carta de adjudicação também e posteriormente protocolizada para registro, o oficial está impedido de proceder ao registro desta ao arrepio do cumprimento das exigências dos títulos antecessores que, assim, não registrados, maculariam o princípio da continuidade do registro público. As exigências não se convalidam em cumprimento pelo simples transcurso de lapso temporal. Negado provimento ao apelo”. (TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS – Terceira Câmara Cível - Apelação Cível nº 1.0024.03.893744-7/001 - Comarca de Belo Horizonte - Relator: Des. Lamberto Sant'anna - Data do acórdão: 02/09/2004 - Data da publicação: 24/09/2004).

Lado outro, a procuração em causa própria referida na inicial e cujo traslado encontra-se às fls. 6/8, contém os requisitos legais para ser considerada como tal, porquanto nela presentes o imóvel alienado (res), o preço (pretium) e o acordo (consensus).

Com efeito, a procuração em causa própria vale, conforme o caso, como instrumento ou escritura de cessão de direitos ou como escritura de compra e venda de imóveis, não podendo ser revogada e não se extinguindo pela morte de qualquer das partes, conforme expressamente estabelece o artigo 685 do Código Civil, a saber:

Art. 685. Conferido o mandato com a cláusula "em causa própria", a sua revogação não terá eficácia, nem se extinguirá pela morte de qualquer das partes, ficando o mandatário dispensado de prestar contas, e podendo transferir para si os bens móveis ou imóveis objeto do mandato, obedecidas as formalidades legais”.

Tanto é verdade que para se lavrar a procuração em causa própria teve o mandatário adquirente que recolher aos cofres públicos o imposto de transmissão inter vivos, anotado naquele instrumento pelo valor de “Cr$377.700,00”, ao passo que o tabelionato se viu obrigado a emitir a declaração sobre operação imobiliária.

Ora, em se tratando de instrumento público irrevogável e irretratável, com preço pago e imposto de transmissão recolhido, possível a qualquer tempo o seu registro imobiliário.

E nem se argumente que a lei de registros públicos (6.015/73) não faz qualquer remissão a procuração em causa própria, porquanto no rol dos títulos admitidos para registro, previsto em seu artigo 221, sabiamente o legislador fez consignar no inciso I a forma genérica das “escrituras públicas, inclusive as lavradas em consulados brasileiros”. Como se sabe, a procuração lavrada em tabelionato é também uma escritura pública...

Extrai-se da doutrina de MARIA HELENA DINIZ ser a procuração em causa própria,

"outorgada no interesse exclusivo do mandatário e não no do mandante, isentando, por isso, o mandatário da necessidade de prestação de contas (RT, 502:66, 515:191), dando-lhe poderes ilimitados, equivalendo tal mandato à venda ou cessão (RT 237:227, 323:214, RF, 157:118, 102:93; AJ, 107:325, 109:449). Portanto, a procuração em causa própria nada mais é do que uma cessão de direitos, por haver transferência irrevogável do direito do mandante para o mandatário, (...). É uma cessão, que pode operar transmissão de propriedade, visto conter concessão de poderes ilimitados na disposição do bem, por atribuir qualidade de dono da coisa ou do negócio, sendo lavrada por escritura pública levada a registro. Dispensa, obviamente, a prestação de contas. Difere da compra e venda, porque nesta o adquirente age em nome próprio, e, na procuração em causa própria, o mandatário age em nome do mandante que é o alienante. Tal procuração não se extinguirá com a morte do mandante ou do mandatário, pois os sucessores do alienante deverão respeitá-la e os do adquirente poderão levar o título a registro" (In, DINIZ, Maria Helena, Tratado Teórico e prático dos contratos, Saraiva, São Paulo, Vol. 3, 2.ª Ed., 1996, p. 253). – Grifei.

Ainda a respeito da possibilidade do registro imobiliário da procuração em causa própria, desde que contenha os requisitos essenciais (instrumento público, preço, objeto e consenso), destacam-se as seguintes passagens do voto proferido pelo eminente Desembargador José Amâncio, quando do julgamento pela 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais da Apelação Cível nº 1.0470.04.016810-1/001, da Comarca de Paracatu:

“Ademais, a procuração em causa própria deveria ter sido registrada no Cartório de Registro de Imóveis, mencionando o preço, não citado em nenhum momento no instrumento de mandato (f. 09), sendo conveniente salientar ser o contrato de compra e venda aquele em que uma parte (vendedor) compromete-se a transferir a outra (comprador) o domínio de um bem mediante o pagamento de uma certa quantia em dinheiro ou valor fiduciário equivalente.

A exigência do registro da procuração no Cartório de Registro de Imóveis, justifica-se pelo fato de que o ordenamento jurídico pátrio não reconhece força translativa de domínio aos contratos, nos temos do artigo 1.245, § 1º do Código Civil, verbis:

"Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis.

§1º. Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel".

A propósito:

"EMBARGOS DE TERCEIRO - PROCURAÇÃO EM CAUSA PRÓPRIA NÃO REGISTRADA NO CARTÓRIO DE IMÓVEIS, DA QUAL NÃO CONSTA A FIXAÇÃO DO PREÇO DO BEM - ELEMENTO ESSENCIAL DO CONTRATO DE COMPRA E VENDA - COMPRA E VENDA INEXISTENTE - REGISTRO DO TÍTULO TRANSLATIVO - CONDITIO SINE QUA NON PARA TRANSFERÊNCIA DO DOMÍNIO DE BEM IMÓVEL - APLICAÇÃO DO ART. 530, INCISO I, DO CÓDIGO CIVIL - PROPRIEDADE OU POSSE NÃO COMPROVADAS, NOS TERMOS DO ART. 1046, CAPUT, E §1º, DO CPC - LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - INEXISTÊNCIA. Para que se atribua à procuração em causa própria o valor de um contrato de compra e venda, necessário tratar-se de documento que contenha os elementos essenciais àquele contrato, quais sejam, a coisa, o preço e o consentimento e que esteja registrado no Cartório de Imóveis. (...)" (TAMG - Apelação Cível nº 298.789-9, Terceira Câmara Cível, rel. Juiz Kildare Carvalho, J. 23 de fevereiro de 2000).

Já nos idos de 1964, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL no julgamento do Recurso Extraordinário nº 54.633, relatado pelo insuperável Ministro Evandro Lins, assentava que a procuração em causa própria,

“é título equiparável a escritura de compra e venda para as transações imobiliárias, mas para a transferência da propriedade é necessária a sua transcrição no registro de imóveis

Desta forma, possível aos requerentes promover o registro imobiliário da procuração em causa própria cujo traslado se encontra às fls. 06/08, transferindo dessa forma o domínio do imóvel nela descrito, cujo preço foi integralmente pago, para o mandatário-adquirente ........................

É certo que o registro imobiliário deve usar de redobrados cuidados no registro da procuração em causa própria, muitas vezes utilizada para infringir regras rígidas do Sistema Financeiro da Habitação, que impedem a compra e venda de imóveis adquiridos com recursos oriundos de programas habitacionais do Governo, com juros inferiores ao do mercado.

No entanto essa mesma vedação ao registro da procuração em causa própria também se aplica às escrituras públicas de compra e venda desses imóveis, sem anuência do credor hipotecário, o que não ocorre no caso concreto onde já houve a quitação do crédito habitacional, com liberação da hipoteca (fl. 10).

E uma vez registrado tal título, com a transferência do domínio, basta uma simples retificação por termo nos autos do inventário, do número do registro imobiliário, para possibilitar o registro do formal de partilha já expedido e, com isso, atingir a pretensão dos requerentes.

Disso tudo decorre não necessitarem os requerentes de obter qualquer declaração judicial, faltando-lhes o indispensável interesse para movimentar a máquina judiciária, e, conseqüentemente, uma das condições da ação.

Em face do exposto, INDEFIRO A PETIÇÃO INICIAL, o que faço com fulcro no artigo 295, inciso III do Código de Processo Civil, por faltar aos requerentes interesse processual.

Custas pelos requerentes, já recolhidas.

Ao trânsito, arquivem-se com baixa.

P. R. I.

Varginha, 03 de julho de 2007.

ANTONIO CARLOS PARREIRA -
Juiz de Direito da Vara de Família e Sucessões

quinta-feira, 6 de março de 2008

INVENTÁRIO - FORO - COMPETÊNCIA RELATIVA

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 87.938 - MG (2007/0168798-0) - RELATOR : MINISTRO SIDNEI BENETI

AUTOR : WALDIR DE CARVALHO TIAGO - ESPÓLIO REPR. POR : IMIRENE SOUZA PICANÇO - INVENTARIANTE

ADVOGADO : EDUARDO PEREIRA

SUSCITANTE : JUÍZO DE DIREITO DA VARA DE FAMÍLIA E SUCESSÕES DE VARGINHA - MG

SUSCITADO : JUÍZO DE DIREITO DA 2A VARA DA FAMÍLIA E SUCESSÕES DE PRAIA GRANDE - SP

DECISÃO

(1) Trata-se de conflito negativo de competência suscitado pelo JUÍZO DA VARA DE FAMÍLIA E SUCESSÕES DE VARGINHA - MG contra o JUÍZO DA 2ª VARA DE FAMÍLIA E SUCESSÕES DA COMARCA DE PRAIA GRANDE - SP, nos autos da ação de inventário dos bens deixados por VALDIR DE CARVALHO TIAGO.

(2) Ajuizada a ação perante o Juízo de PRAIA GRANDE, o Juízo, de ofício, declinou da competência, encaminhando os autos para o Juízo de VARGINHA, ora suscitante, com os seguintes fundamentos:

A certidão de óbito contém fé pública e goza de presunção relativa de veracidade. Assim, enquanto não modificada por meio de causa própria, prevalece o que dela consta.

Segundo consta da certidão de óbito a fls. 06, o falecido era residente na Cidade de Varginha/MG.

Nos termos do art. 1785 do Código Civil e, artigo 96 do Código de processo Civil, a sucessão abre-se no último domicílio do falecido.

Assim sendo, o Foro da Comarca de Varginha é o competente, para processar e julgar o presente (fl. 29).

(3) O Juízo de VARGINHA, por sua vez, suscitou o presente conflito, com base nos seguintes fundamentos:

Trata-se de processo de inventário ajuizado por pessoa residente na Comarca de Praia Grande, Estado de São Paulo (...) Ainda não foram prestadas as primeiras declarações, mas pelos documentos carreados com a inicial tudo levar a crer que eventuais bens deixados pelo de cujus se localizam no vizinho Estado bandeirante.

Pela r. decisão de fl. 29, o MM. Juiz de Direito da 2ª Vara da Família e Sucessões da Comarca de Praia Grande - SP, declinou da competência de ofício para esta Comarca de Varginha, com base nos arts. 1.785 do Código Civil e 96 do Código de Processo Civil, por constar da certidão de óbito do inventariado que residia ele nesta Comarca. No entanto, como se sabe, a competência do artigo 96 do CPC é meramente relativa, somente podendo ser declinada se a parte ajuizar a tempo e modo a Exceção prevista no art. 112 do Código de Processo Civil (fl. 33).

(4) Instado, o Ministério Público Federal opina seja declarada a competência do Juízo suscitado (fls. 38/41).

É o relatório.

(5) A matéria sub judice já se encontra pacificada no âmbito desta Corte, no sentido de que a competência para processar e julgar ação de inventário é do foro do domicílio do autor da herança, conforme estabelece o caput do art. 96 do Código de Processo Civil.

(6) Considerando, no entanto, que a competência territorial é considerada relativa no caso de inventário, não é cabível declinação de ofício, nos termos do enunciado 33 da Súmula desta Corte Superior, verbis: "a incompetência relativa não pode ser declarada de ofício".

(7) Esta é a jurisprudência da Segunda Seção deste Superior Tribunal de Justiça que se observa no Conflito de Competência nº 19.334/MG, Relator Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, DJ de 25.2.2002:

COMPETÊNCIA. CONFLITO. CPC, ART. 96. FORO COMPETENTE. INVENTÁRIO. COMPETÊNCIA TERRITORIAL. NATUREZA RELATIVA. IMPOSSIBILIDADE DE DECLINAÇÃO DE OFÍCIO. ENUNCIADO Nº 33 DA SÚMULA/STJ. FALTA DE ATENÇÃO. CONFLITO CONHECIDO. I - Cuidando-se de competência territorial, cuja natureza relativa comporta prorrogação, não é dado ao juiz declarar-se incompetente de ofício, incidindo, no ponto, o enunciado nº 33 da sumula deste Tribunal. II - Nos termos do art. 96, CPC, é competente para processar o inventário o foro do domicílio do autor da herança, somente havendo superfície para outras considerações a esse respeito quando ele não tenha tido domicílio certo. III – Sem embargo do habitual e desumano excesso de serviço na Justiça, não se justifica que, em casos como o dos autos, não se dê a devida atenção à espécie, tornando ainda mais difícil, para o cidadão, a prestação jurisdicional.

(8) No mesmo sentido: CC 91.611/DF, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JÚNIOR, DJ. de 07.12.2007; CC 58.642/MG, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, DJ 29.08.2007.

(9) Ademais, como bem salientou o Ministério Público, a incompetência relativa, se verificada, deve ser argüida "por meio de exceção (CPC, art. 112 e Súmula 33/STJ) " (fls. 39).

(10) Pelo exposto, com amparo no artigo 120, parágrafo único, do Código de Processo Civil, conhece-se do conflito e declara-se competente o Juízo Suscitado ( 2ª Vara de Família e Sucessões de Praia Grande - SP).

(11) Comunique-se. Publique-se.

Brasília (DF), 14 de fevereiro de 2008.

Ministro SIDNEI BENETI – Relator


A LEI 11.441 E A POSSIBILIDADE DE PRISÃO POR DÍVIDA ALIMENTAR

ANTONIO CARLOS PARREIRA

Juiz de Direito da Vara de Família e Sucessões de Varginha - MG

Em interessante artigo publicado na página da internet do Colégio Notarial do Brasil, Seção de São Paulo, a DRª MARLISE BEATRIZ KRAEMER VIEIRA sustenta a impossibilidade de se executar o devedor de alimentos, pelo rito do artigo 733 do Código de Processo Civil, com a sanção de prisão, nas hipóteses em que a obrigação alimentar for estabelecida entre os ex-cônjuges em escritura pública de separação, na forma permitida pela Lei 11.441, de 04 de janeiro de 2007.

Isto porque, nas suas corretas palavras, “o artigo 733 do C.P.C., que disciplina a executiva por dívida alimentar, sob pena de prisão, expressamente refere a sentença ou decisão, ou seja, a fixação alimentar ou o acordo que os estabeleceu necessariamente tem de passar sob o crivo do Judiciário. Logo, como a escritura pública que trata da separação de um casal não é encaminhada ao Judiciário, inexiste no caso uma decisão ou uma sentença”.

Concluindo, recomenda a ilustre doutrinadora: “Cumpre aos advogados alertar seus clientes sobre a questão, de modo a que, no futuro, a opção que parecia mais célere não venha a se tornar fonte de graves prejuízos aos alimentados, e raiz de intermináveis conflitos judiciais”.

A uma primeira análise são invencíveis os argumentos da eminente Advogada sulista, sendo o entendimento jurisprudencial predominante da impossibilidade de se executar alimentos, segundo o rito do artigo 733 do CPC, com possibilidade de prisão, quando o título executivo é extrajudicial (acordo de alimentos por escritura pública, ou referendado pela Defensoria Pública ou pelo Ministério Público, etc.).

Ao menos nos Estados de Minas Gerais e do Rio Grande do Sul esse o entendimento dos Tribunais de Justiça.

Tanto assim que em recente artigo, também publicado na página da internet do Colégio Notarial do Brasil, Seção de São Paulo, intitulado de “Anotações acerca das separações e divórcios extrajudiciais”, o eminente DESEMBARGADOR LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, professor da Escola da Magistratura da Ajuris e presidente do IBDFAM-RS, abordou o assunto em pauta nos seguintes termos:

“Questão externa à lei em exame é a que diz com a possibilidade ou não de executar coercitivamente os alimentos fixados mediante escritura pública. Isso porque o art. 733 do CPC, ao regrar essa modalidade executória, a restringe à execução de títulos judiciais. E nesse sentido têm se manifestado, de forma quase unânime, doutrina e jurisprudência.

Embora a Lei 11.441/07 não tenha feito qualquer menção ao tema, pensamos que, diante da nova realidade, é necessário repensar a matéria, em uma perspectiva sistemática. Quando da entrada em vigor do Código de Processo Civil não se cogitava de o Estado-Juiz deixar de intervir no momento da dissolução da sociedade conjugal ou do vínculo matrimonial, ocasião na qual muitas vezes são feitas estipulações alimentares. Ora, se ficar mantida a restrição da execução coercitiva exclusivamente aos alimentos fixados em juízo, em muito restará desestimulada a pactuação extrajudicial que agora se busca incentivar, o que configura uma contradição insuperável, que não deve sobreviver no âmago de um mesmo ordenamento jurídico”.

E concluindo, arrematou: “Por isso entendemos que doravante deve ser admitida a execução coercitiva aparelhada também em pacto formalizado por instrumento público.”

Tenho o mesmo pensamento do ilustre Desembargador Luiz Felipe quanto à necessidade do Judiciário mudar o entendimento, passando a admitir as execuções de alimentos sancionadas com prisão civil, ajuizadas com base em títulos extrajudiciais, em especial escrituras públicas.

Primeiro porque, como bem observado pelo ilustre Desembargador Gaúcho, se assim não agirmos haverá desestímulo aos pactos extrajudiciais, fazendo letra morta da lei cujo objetivo foi retirar do Poder Judiciário tais questões, sem que houvesse perda da segurança jurídica.

Segundo porque, da leitura do artigo 19 da Lei 5.478, de 25 de julho de 1968 (Lei de Alimentos), norma essa de cunho especial, conclui-se em relação aos alimentos pela existência não somente da execução de sentença (por título judicial), como também da execução de acordo (título extrajudicial). E mais, de forma clara e cristalina tal norma permite ao Juiz de Direito, na execução do acordo, tomar todas as providências necessárias ao seu efetivo cumprimento, inclusive decretar a prisão do devedor.

Vejamos:

“Art. 19. O juiz, para instrução da causa ou na execução da sentença ou do acordo, poderá tomar todas as providências necessárias para seu esclarecimento ou para o cumprimento do julgado ou do acordo, inclusive a decretação de prisão do devedor até 60 (sessenta) dias.

Muitos poderão argumentar, inclusive com base na própria Lei Especial, que o acordo a que se refere o artigo 19 da Lei de Alimentos é aquele realizado em Juízo, na ação de alimentos, homologado pelo Juiz e, assim, também um título judicial. Mas se o é, a execução é da sentença homologatória, vale dizer, o título executivo judicial é a sentença homologatória do acordo, conciliação ou transação, de modo que não havia necessidade do legislador incluir a expressão “ou do acordo”. Ou então teria que se referir ao “acordo homologado pelo Juiz”.

Portanto, possível utilizar o artigo 19 da Lei de Alimentos para, em execução de alimentos por título extrajudicial, decretar a prisão civil do devedor relapso.

Assim agindo o julgador atenderá aos fins sociais a que se destinam a Lei de Alimentos e a Lei 11.441/2007, segundo a lapidar regra constante do artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil e atendendo a conclamação do DESEMBARGADOR LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS no sentido de que, “...doravante deve ser admitida a execução coercitiva aparelhada também em pacto formalizado por instrumento público.”

Aliás, em 12 de dezembro de 2002 esse foi o entendimento do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS, com base justamente no artigo 19 da Lei de Alimentos, consoante decisão unânime da 3ª Câmara Cível, composta à época pelos Desembargadores SCHALCHER VENTURA (relator), LUCAS SÁVIO V. GOMES e KILDARE CARVALHO, quando do julgamento da Apelação Cível nº 000.260.620-0/00, da Comarca de Uberlândia, com a seguinte ementa: “EXECUÇÃO DE ALIMENTOS - TÍTULO EXTRAJUDICIAL - PROVIMENTO - ADMITE-SE A EXECUÇÃO DE ALIMENTOS FUNDADA EM TÍTULO REFERENDADO POR ACORDO PERANTE A DEFENSORIA PÚBLICA”.

Do voto do Relator se extrai as seguintes passagens:

“Por outro lado, a Lei de Alimentos (Lei nº 5.478/68) impõe:

"Art. 19. O juiz, para instrução da causa, ou na execução da sentença ou do acordo, poderá tomar todas as providências necessárias para seu esclarecimento ou para cumprimento do julgado ou do acordo, inclusive a decretação de prisão do devedor até 60 (sessenta) dias." (grifei)

Portanto, não há necessidade de ser o acordo, referendado pela Defensoria Pública ou pelo Ministério Público, homologado judicialmente. Aplica-se ao caso o princípio da economia processual, pois tal homologação, além de dispensável pela legislação, apenas acarretaria desperdício de tempo e dinheiro.

Assim, deve ser aplicado o artigo 733, do CPC:

"Art. 733. Na execução de sentença ou de decisão, que fixa os alimentos provisionais, o juiz mandará citar o devedor para, em três dias, efetuar o pagamento, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo."

Diante do exposto, dou provimento ao recurso e reformo a sentença, para que a execução de alimentos tenha prosseguimento nos moldes do já citado artigo 733, do Código de Processo Civil.” (Os destaques são de minha autoria).

Interessante como muitas decisões judiciais estão à frente de seu tempo...

Em suma: não podemos nós, aplicadores da nova Lei, que veio simplificar as separações e os divórcios consensuais sem a presença do Estado-Juiz, em virtude de sua desnecessidade, ficarmos amarrados a normas, convenções e entendimentos ultrapassados, da época quando a indesejada presença do Estado nas relações dos casais era obrigatória. E o que é pior, favorecendo com esse apego formalístico os devedores relapsos, em prejuízo de bens maiores, quais sejam, a fome e a própria dignidade do credor de alimentos.

Portanto, nessa matéria relacionada aos alimentos convencionados entre os casais, em escrituras públicas de separação e divórcio, das duas uma: ou jogamos fora a Lei 11.441 ou aplicamos aos devedores de alimentos o art. 19 da Lei 5.478/68, combinado com o artigo art. 733 do Código de Processo Civil.

Não tenho dúvida em escolher a segunda opção, como forma de dar aplicabilidade à nova lei.

Se estiver errado, com certeza ficarei em boa companhia.


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